Psicóloga defende que rede de apoio precisa atender à família toda e não apenas à criança vítima de violência sexual
A/o psicóloga/o tem a função, dentro do atendimento às vítimas, de realizar a escuta da criança e da família, assim como apoiar essas pessoas
Todos os dias 47 crianças são vítimas de abuso, exploração ou turismo sexual no Brasil. É de posse desse dado preocupante que o CRP-16 lembra nessa quinta-feira, 18 de maio, do Dia de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes. Os dados são do Disque 100 e entidades que atuam na prevenção e acolhimento das vítimas e de suas famílias afirmam que o número é subestimado, pois muitas violações não são contabilizadas.
De acordo com a psicóloga, professora da Ufes e colaboradora do CRP-16, Edinete Maria Rosa, o Espírito Santo vem reduzindo o número de notificações desses casos. Ela explica que isso ocorre por razões como a redução das denúncias ao Disque 100, pois as vítimas são encaminhadas para os aparelhos de apoio social como conselho tutelar, CRAS e CREAS, uma vez que a rede foi ampliada. Além disso, serviços de saúde, que historicamente são os que mais acolhem, e as escolas também fazem esse acolhimento que não entra nessa contagem nacional.
“Não temos no Brasil um sistema seguro para saber esses números”, disse. Isso tende a mascarar o problema. Além disso, nem sempre a família vai ao atendimento com o adolescente ou a criança, pois há uma tentativa de ocultar o fato por conta do sofrimento e vergonha.
São várias consequências para as vítimas desse tipo de violência. Edinete lembra que a criança pode apresentar aversão ao próprio corpo e pode, inclusive, não querer mais tomar banho para tornar o próprio corpo menos atrativo para o agressor e afastá-lo. Além disso, muitas acham que o problema é responsabilidade dela e podem entrar em depressão e até mesmo tentar o suicídio. Outro sinal que uma criança que está sofrendo violência sexual pode dar é o interesse por brincadeiras de cunho sexual. Outro comportamento comum é ficar muito desligada, pois está vivenciando uma situação da qual não consegue sair sozinha.
“Não é preciso que haja penetração para ser violência. Basta o aliciamento. Mas quando chega a uma violência a criança ou o adolescente se vê envolvida/o na relação e o agressor tende a colocá-la/lo como cúmplice e ela/ele acaba achando que está envolvida desenvolvendo uma certa culpa”, explicou. A professora acrescentou que, muitas vezes, esse envolvimento inclui também a família com a presença vantajosa do agressor que pode ajudar de alguma forma como com presentes e contribuições financeiras. Essa situação promove a quebra de confiança no adulto, já que as pessoas próximas podem ser as agressoras ou podem ter uma relação com os agressores deixando a criança desprotegida.
Denúncia
“A denúncia é delicada e precisa ser feita adequadamente. Se for assim será fator de proteção. Mas se ela for feita a uma pessoa que não acredita na criança ou a um profissional ou órgão que desqualifique o relato, a vítima será revitimizada, sendo obrigada a recordar várias vezes aquela violência até que o apoio seja acessado. Envolvê-la em uma busca por uma veracidade é prejudicial. Primeiro é preciso procurar o Conselho Tutelar, mas se o relato for muito claro e houver evidências fortes de violência no corpo da criança, essa etapa pode ser transposta e a denúncia pode feita diretamente nas delegacias especializadas”, disse.
A/O psicóloga/o tem a função, dentro do atendimento às vítimas, de realizar a escuta da criança e da família, assim como apoiar essas pessoas. Para que a criança vença mais rápido o problema é preciso um apoio positivo das pessoas que vivem na casa. “O sofrimento de uma mãe que descobre que seu parceiro violentou a filha, por exemplo, é muito grande e mexe com toda a organização familiar que pode descobrir a partir dali que outras crianças também foram vítimas. A rede de apoio precisa atender à família toda e não apenas a vítima”.
É importante lembrar que todo profissional é obrigado a comunicar suspeitas de violência ao Conselho Tutelar ou à delegacia (nos casos mais evidentes). A atenção a esse problema é essencial já que essas violências deixam marcas que podem ficar para vida toda. “A criança é um sujeito de direito, com plena cidadania e com direito à proteção, pois é vulnerável e não consegue se proteger sozinha”, concluiu Edinete.