GT Capixaba sobre Psicologia, Maconha e Psicodélicos vai fomentar o debate no Estado para além da lógica biomédica
O debate da Psicologia em torno do uso terapêutico de maconha e psicodélicos ganha um importante aliado no Estado com a criação do Grupo de Trabalho (GT) Capixaba sobre Psicologia, Maconha e Psicodélicos.
O GT nasceu de uma articulação de psicólogas/os capixabas, que atuam em diferentes âmbitos, inclusive com pesquisas acadêmicas na Ufes e com a política de redução de danos. Esses profissionais procuraram o CRP-16, e o VII Plenário do Conselho deliberou pela criação do GT em âmbito institucional.
Vinculado ao CRP-16, o GT vai fomentar a discussão no Estado, estando alinhado a uma deliberação da Assembleia de Políticas da Administração e das Finanças (APAF) do Sistema Conselhos de Psicologia.
A Apaf criou um GT (do Conselho Federal de Psicologia) homônimo ao grupo de trabalho no ES para promover um congresso e subsidiar o debate nos Conselhos Regionais.
Os trabalhos devem acontecer na perspectiva da criação de políticas públicas sempre observando a ética, o cuidado integral e interdisciplinar, visando levar a temática para além do contexto biomédico.
Em breve, GT Capixaba deve convocar a categoria no Estado para participar de um mapeamento que vai apontar a percepção das/os psicólogas/os capixabas sobre maconha e psicodélicos.
Atento ao cuidado à saúde mental, CRP-16 acolhe demanda
O presidente do CRP-16, Thiago Pereira Machado, explicou o porquê de o Conselho ter acolhido à demanda de criação do GT sobre Psicologia, Maconha e Psicodélicos.
“É um tema que incide sobre nós enquanto Sistema Conselhos de Psicologia. É compromisso e responsabilidade do Conselho estar atento às pautas atuais que envolvem o cuidado em saúde mental. Os estudos e pesquisas envolvendo maconha e psicodélicos têm sido relevantes para serem trabalhados nesse contexto. Por ser algo que afeta diretamente o cuidado em saúde mental da população, cabe ao Conselho de Psicologia debater sobre isso, até para qualificar o debate e poder construir ações formativas de orientação para a categoria e para a sociedade. Para que esse cuidado em saúde mental, envolvendo o campo da maconha e dos psicodélicos, possa ser exercido da maneira mais eficaz que garanta o cuidado à população”, salientou o presidente.
Para ele, o GT pode ajudar a desmistificar o contexto que envolve essas substâncias, além de promover a discussão de forma ética e responsável.
Parceria com o Conselho é fundamental
Colaboradora do CRP-16, a psicóloga Tammy Andrade Motta é uma das articuladoras da criação do GT Capixaba sobre Psicologia, Maconha e Psicodélicos. Ela apontou que a parceria com o Conselho é fundamental.
“Criar o GT no âmbito do CRP-16 confere legitimidade à pauta e reforça o compromisso da Psicologia capixaba com uma atuação profissional socialmente responsável, eticamente orientada e politicamente sensível. Além disso, a proposta de produzir materiais informativos e apoiar a atuação de profissionais da Psicologia reflete um compromisso com a formação crítica da categoria, contribuindo para a construção de conhecimento e práticas educativas que enfrentem estigmas históricos e promovam o cuidado integral”, argumentou.
A psicóloga abordou que a criação do GT nasceu de um debate que vem sendo feito em todo o País.
“É um desdobramento de um movimento nacional de discussão sobre os usos da maconha e dos psicodélicos orientado por uma perspectiva ética, crítica, informada e antiproibicionista”, pontuou.
Tammy ressaltou que o grupo de psicólogos capixabas participou de eventos realizados em Brasília, no Rio de Janeiro, reunindo saberes e práticas observando a necessidade de haver um espaço institucional para fortalecer o debate para além da perspectiva biomédica tradicional. E, ainda, de se pensar a construção de políticas públicas e de uma formação continuada com base em uma ética do cuidado, do respeito à diversidade e da justiça social.
Desafios. Se é importante fomentar o debate para além da lógica biomédica, também se faz necessário enfrentar a onda conservadora e proibicionista tão presente na sociedade.
“Os desafios são múltiplos e complexos, sobretudo porque vivemos em um contexto social marcado por forte conservadorismo, proibicionismo e epistemicídio. Discutir psicodélicos e maconha a partir de uma perspectiva antirracista, antiproibicionista e decolonial confronta diretamente o modelo biomédico hegemônico, o racismo institucional e a lógica colonial de produção de conhecimento”, frisou a psicóloga.
Não para por aí. Tammy apontou mais uma questão desafiadora, já que o debate da Psicologia se propõe a dialogar com a ancestralidade dos povos originários.
“Há uma resistência institucional e cultural de reconhecer os saberes ancestrais e os usos tradicionais dessas medicinas, especialmente quando vindos de povos indígenas e comunidades negras. Além disso, a proposta de integração psicodélica que considere as interseccionalidades e as desigualdades sociais, econômicas e raciais exige uma crítica profunda ao modelo neoliberal de saúde, à privatização do saber e à medicalização da vida”, analisou.
A psicóloga acrescentou que é preciso coragem política para realizar a “articulação com movimentos sociais, apoio institucional sólido e um compromisso constante com a construção de um outro modelo de saúde — mais plural, democrático e inclusivo”.
Planos de trabalho e mapeamento
A conselheira do CFP e coordenadora do GT Psicologia, Maconha e Psicodélicos da Apaf/CFP, Maria Carolina Fonseca Barbosa Roseiro, foi a responsável pela organização do “Congresso Brasileiro de Psicologia, Maconha e Psicodélicos: Ética, Saberes Ancestrais e os Caminhos para Atuação”.
O evento foi organizado pelo CFP, em parceria com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) do Distrito Federal e o Instituto do Cérebro da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (ICe/UFRN), em Brasília, em outubro de 2024.
Ela lembrou que o Congresso foi realizado a partir de um mapeamento, feito pelo GT do CFP/Apaf, com a participação dos Conselhos Regionais de todo o Brasil. Após o evento, o GT, por via dos representantes de cada região, começou a elaborar um plano de trabalho para o Sistema Conselhos.
“Esse plano de trabalho está em elaboração e deve ser apresentado na Apaf de dezembro de 2025”, adiantou Carolina Roseiro, que é psicóloga inscrita no CRP-16.
Ela falou mais sobre o plano de trabalho: “Tem como foco as possibilidades de regulamentação das práticas psicológicas associadas aos usos terapêuticos, o que abrange, por exemplo, panorama e incidências da Psicologia em políticas públicas e marcos legais relacionados a essas substâncias, debates e orientações sobre efeitos e qualidade das substâncias quanto aos usos terapêuticos, atuação multiprofissional e debate sobre o papel da Psicologia na prescrição das substâncias, protocolos terapêuticos e produção científica, compreensão dos saberes populares, indígenas e de comunidades tradicionais”.
Como todos os CRs vão participar da aprovação do plano, a conselheira do CFP sinalizou que é muito importante que os mapeamentos e debates regionais sejam realizados.
Parceria com o CRP-RJ
O psicólogo capixaba Ernesto Grillo Rabello participou, em novembro de 2024, do
II Congresso Brasileiro sobre Psicodélicos: Integração, acesso e regulação, promovido pela Associação Psicodélica do Brasil (APB), no Rio de Janeiro.
Ele representou o CRP-16 na mesa Psicodélicos e Conselhos de Psicologia que teve a participação dos Regionais do Rio de Janeiro, de São Paulo, do Paraná e de Pernambuco.
“Fiz uma fala sobre as ações, pesquisas que nós já estávamos fazendo aqui no Espírito Santo. E lá tomamos conhecimento sobre os trabalhos dos CRPs que já tinham GT ou eixos sobre o tema”, assinalou o psicólogo.
Rabello tomou conhecimento de um questionário que o CRP-RJ fez e que serviu como base para um que o CRP-16 fará. Além do vínculo com os demais Regionais.
“Tivemos essa aproximação com o CRP do Rio, e estamos elaborando o questionário junto deles. Mas, de modo geral, entramos em contato com os outros conselhos regionais. Criamos um grupo de WhatsApp para continuar se comunicando com representantes do Rio, São Paulo, Paraná e Pernambuco”, acrescentou.
Além de representar o CRP-16 no Congresso no Rio, o psicólogo apresentou seu trabalho sobre: “Não nos apaixonemos pelo poder: terapias psicodélicas e as armadilhas neoliberais”.
Rabello também representou o Espírito Santo no Congresso que o CFP realizou em Brasília em outubro, integrando a delegação capixaba que esteve na capital federal, junto do presidente do CRP-16, Thiago Pereira Machado, da psicóloga Tammy, da psicóloga Carolina Roseiro (pelo CFP) e do psicólogo Getúlio Pinto, que representou o governo do ES.