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Retrocesso: Governo Federal modifica política de saúde mental e abre espaço para volta de manicômios

Postado no dia 9 de janeiro de 2018, às 04:36

CRP-16 é contrário às alterações e defende serviços substitutivos que garantam liberdade e inclusão das pessoas em sofrimento mental na sociedade

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O Ministério da Saúde lançou em dezembro uma minuta que desconsidera a Portaria 3088/MS/GM de 2011, que instituiu a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) no Brasil. No mesmo mês, o Ministério da Saúde foi além e anunciou o lançamento do que chamou de “Nova política de saúde mental”, com medidas que psicólogas e psicólogos avaliam como um desmantelamento da RAPS, que foi fruto da atuação do movimento da Reforma Psiquiátrica Brasileira, em um esforço dos usuários, familiares e profissionais da saúde.

As novas diretrizes são opostas às deliberações das Conferências Nacionais de Saúde e de Saúde Mental, espaços legítimos de participação e controle social do Sistema Único de Saúde (SUS). O CRP-16 se manifesta publicamente contrário às alterações propostas pelo Governo Federal e continuará defendendo uma sociedade sem manicômios.

De acordo com a psicóloga Keli Lopes Santos, mestre em Psicologia Institucional e presidente da Comissão de Saúde do CRP-16, a chamada “nova política” altera as regras de financiamento e ampliação de repasse de recursos para Comunidades Terapêuticas (CT) visando o tratamento de pessoas com problemas decorrentes do uso de substâncias psicoativas, por exemplo.

“A esse respeito, cabe lembrar que não existe comprovação técnico-científica de resolutividade nas ações das Comunidades Terapêuticas, além de a grande maioria destas instituições promover a exclusão e segregação de pessoas, violando direitos humanos como já denunciado nos relatórios da 4ª Inspeção Nacional de Direitos Humanos produzido pelo Conselho Federal de Psicologia em 2011 e reafirmado neste ano, pela Inspeção Nacional promovida pelo Ministério Público Federal e Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura,. Isso tudo após visita a várias comunidades terapêuticas em diferentes estados”, disse.

Manicômios

Dentre as inúmeras alterações que os profissionais de saúde apontam como retrocesso está a ampliação de repasses de recursos para hospitais psiquiátricos especializados e a redução de repasse e abertura de leitos de Saúde Mental em Hospitais Gerais. O psicólogo Flavio Martins de Souza Mendes, que também é psicanalista e mestre em Psicologia, lembra que os movimentos de luta antimanicomial têm militado há décadas pela redução do número de leitos em hospitais psiquiátricos que, segundo já denunciado, recolheram, violentaram e mataram milhares de pessoas que sequer possuíam diagnóstico de transtorno mental, sob justificativa de periculosidade.

“Vale lembrar que as psicólogas e os psicólogos do Espírito Santo, durante o 8º Congresso Nacional de Psicologia no ano de 2013, produziram moção de repúdio à hoje extinta Clínica Psiquiátrica Santa Isabel de Cachoeiro de Itapemirim. Houve apoio da categoria do restante do país que participava do Congresso. Isso sinaliza que a Psicologia brasileira está comprometida com o fim de todo e qualquer tipo de manicômio ou modalidade de ‘tratamento’ pautado pela segregação e violação dos direitos humanos”, enfatizou Flavio, que é psicólogo convidado na Comissão de Saúde do CRP-16.

Sem diálogo

De acordo com Camila Mariani Silva, mestre em Psicologia Social e militante do Núcleo de Luta Antimanicomial do Espírito Santo, as propostas recentes de mudanças nas políticas públicas de saúde mental foram feitas por poucas pessoas, sem que houvesse conversa ou debate com as outras milhares de pessoas que têm lutado e acreditado na Reforma Psiquiátrica no Brasil.

“As mudanças nas quais acreditamos têm sido realizadas lentamente há 30 anos. Nós prezamos as discussões e decisões coletivas e abrangentes, o que não aconteceu com as propostas apresentadas por esse governo. Nossa política pública de saúde mental é reconhecida mundialmente. Há outros países que trabalham na mesma direção, com a autonomia das pessoas com transtorno ou sofrimento psíquico. Nós, que somos da Luta Antimanicomial, defendemos a liberdade e a singularidade de cada um, dos sujeitos e dos familiares que precisam de acompanhamento e tratamento”, disse.

Camila Mariani Silva, que também é servidora municipal de Vitória e Vila Velha, explica que não há desassistência no Brasil, mas falta de investimento nos equipamentos necessários para fortalecer a Rede de Atenção Psicossocial (Raps). Sem esses investimentos, ela alerta, fica difícil dar a assistência necessária. A Reforma Psiquiátrica garante assistência justa, digna e de qualidade, ampla e coletiva. O discurso que propaga haver desassistência atualmente é uma tentativa de desinformar a sociedade para propor o retrocesso como solução.

Resistência

Várias entidades antimanicomiais, incluindo o Sistema Conselhos de Psicologia, têm se reunido para articular a resistência aos retrocessos que a Reforma Psiquiátrica está sofrendo. A psicóloga e militante do Núcleo Estadual da Luta Antimanicomial Rafaela Amorim alerta que o Ministério da Saúde, junto com a Associação Brasileira de Psiquiatria, tem tomado decisões sobre o rumo da Política Nacional de Saúde Mental sem dialogar com os vários atores que participam do cuidado em saúde mental.

“Uma característica da Reforma Psiquiátrica Brasileira é o envolvimento e o protagonismo dos usuários da saúde mental na construção de um cuidado em liberdade e digno. Isso não tem sido feito pelo atual governo. Não se tem respeitado sequer as deliberações das Conferências de Saúde, em especial a Conferência Nacional de Saúde Mental de 2010, que foi intersetorial e contou com diversas decisões coletivas de um cuidado ampliado, transversal e em liberdade”, explicou.

Rafaela, que também é mestra em Psicologia Institucional, lembra que há falta de vontade política e de financiamento que possibilitem a ampliação e o fortalecimento dos serviços substitutivos. Retorna-se, segundo ela, aos ideais de um suposto tratamento em hospitais psiquiátricos, clínicas e comunidades terapêuticas. “Qual é a dignidade de um tratamento manicomial? Não podemos aceitar esse retrocesso. Não aceitaremos. Continuaremos lutando, pois as pessoas em sofrimento mental não podem ser condenadas à exclusão”.

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